Análise mostra que adaptação de normas infralegais é fundamental para que o país cumpra seu compromisso de restauração e reflorestamento de 12 milhões de hectares até 2030
O Brasil precisa reduzir a burocracia e taxas para conseguir acelerar e dar escala à restauração e reflorestamento de espécies nativas, mostra um novo estudo publicado hoje pelo WRI Brasil. Segundo o estudo, uma análise das legislações federal e em três estados mostra grande oportunidade para que produtores rurais e empresas possam investir silvicultura de nativas, com benefícios ambientais e econômicos.
A restauração de paisagens e florestas é considerada como uma das soluções para enfrentar a questão climática. Não por acaso, a ONU definiu o ano de 2021 como o início da Década da Restauração dos Ecossistemas. Para essa restauração acontecer, no entanto, ela precisa ser vantajosa para o produtor rural. A silvicultura de nativas pode permitir que esse produtor tenha retorno econômico a partir da comercialização de produtos madeireiros e não-madeireiros, e por isso é importante incentivá-la para acelerar o engajamento de pessoas na atividade.
O estudo analisou as legislações estaduais de Espírito Santo, Minas Gerais e São Paulo – regiões onde a recuperação florestal dependem mais da ação humana, em contraste com a Amazônia, onde ela pode ocorrer naturalmente – e contexto jurídico federal, incluindo o SINAFLOR, um sistema federal de gestão de florestas. A principal conclusão é que é urgente uma atualização desse quadro de regras que rege o reflorestamento no Brasil.
“A legislação florestal brasileira traz aspectos que incentivam o reflorestamento com espécies nativas, mas ainda com um olhar no passado, ou seja, parte do pressuposto que a exploração madeireira de florestas nativas se dá essencialmente pelo extrativismo, o que não é mais verdade, pois o reflorestamento já se provou uma atividade altamente produtiva”, explica Luciana Alves, especialista em restauração florestal do WRI Brasil e uma das autoras do estudo.
O efeito perverso dessas taxas sobre quem está plantando árvores para colher madeira foi comprovado mediante a análise de alguns cenários de plantios com espécies nativas de diferentes usos, considerando o marco regulatório federal e dos estados de Espírito Santo, Minas Gerais e São Paulo. Os resultados mostram que as taxas associadas a processos de cadastro, registros, declaração de colheitas e transporte têm forte impacto na viabilidade econômica da silvicultura de baixo investimento e de pequeno porte, tornando-se um fator impeditivo para a diversificação da produção de estabelecimentos rurais menores.
Já em cenários em que se considera a desoneração dessas taxas, o valor presente líquido renderia pelo menos o dobro do esperado com atividades convencionais. Rever a legislação pode ajudar a incluir o pequeno produtor neste novo ciclo de crescimento sustentável no campo. “O Brasil tem um grande potencial para expandir a plantação de florestas nativas”, diz Raul do Valle, diretor de Justiça Socioambiental do WWF-Brasil e um dos autores do estudo. “Mas, para tanto, precisamos ajustar nosso marco legal, simplificando e barateando procedimentos para uma atividade que gera não só benefícios econômicos, mas também ambientais. O estudo aponta alguns caminhos e, principalmente, mostra que não é tão difícil”.
Plantio e manejo de áreas restauradas – Na opinião dos autores, uma das formas de tornar a atividade florestal mais atrativa ao produtor rural é a possibilidade de gerar renda a partir do plantio e manejo sustentável de áreas restauradas. Plantações florestais com espécies nativas têm um papel importante na promoção de paisagens sustentáveis, pois podem produzir madeira e produtos florestais não-madeireiros, além de oferecer serviços ambientais de relevância para a sociedade, como sequestro de carbono, regulação do ciclo hídrico, recuperação de solos e conservação da biodiversidade. São, portanto, florestas multifuncionais. Com altas taxas de crescimento, essas florestas poderiam suprir, em um futuro próximo, boa parte das demandas doméstica e internacional nos mercados de madeira tropical.
O Brasil assumiu voluntariamente compromissos nacional e internacionais de restaurar e reflorestar pelo menos 12 milhões de hectares de florestas até 2030. O Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg) foi estruturado nesse contexto e traça estratégias para o alcance das metas. Uma delas é criar mecanismos eficientes que garantam o cumprimento da Lei de Proteção de Vegetação Nativa, com a recuperação de passivos de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e Reserva Legal (RL).
Estimativas indicam que há cerca de 19 milhões de hectares de passivo – ou seja, áreas irregularmente desmatadas nas quais a vegetação nativa precisa ser recomposta. Desse total, 11 milhões de hectares estão em reservas legais. Estudo do WRI Brasil mostrou que 39% das áreas degradadas da Amazônia e 46% das áreas degradadas do Pantanal têm alto potencial de regeneração natural. Mas em biomas mais fragmentados, intensivamente explorados ou mais vulneráveis à desertificação, como os casos da Mata Atlântica, do Cerrado e da Caatinga, menos de 10% das áreas desmatadas têm alto potencial regenerativo. Portanto, em muitos casos, será necessária uma ação efetiva de plantio. Ações efetivas de plantio tem custos altos associados, e a possibilidade de uso econômico dessas florestas podem custear parte da restauração, ainda mais se a atividade for desonerada de taxas que não contribuem efetivamente para o controle e gestão da atividade pelo estado.
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