As reflexões fizeram parte do discurso de Ariovaldo Zani durante a Fenagra 2018
Vice-presidente executivo do Sindirações, Ariovaldo Zani foi um dos palestrantes da edição 2018 da Feira Nacional da Agroindústria/FENAGRA, realizada no mês de maio, em Campinas, interior de São Paulo. Na ocasião, convidou os participantes a refletirem sobre temas que envolvem “desafios e perspectivas da cadeia produtiva de proteína animal”. A seguir estão os pontos de destaque do discurso:
Oportunidades – De acordo com Zani, é flagrante a contínua prosperidade da agricultura no Brasil. Essa afirmação se justifica basicamente por três fatores.
- Ampliação das oportunidades para exportações do Brasil ao mercado chinês, diante do enfraquecimento do relacionamento entre Estados Unidos e China, por conta das mútuas retaliações;
- Aumento receita exportações agrícolas por conta do câmbio, e relacionada também ao movimento americano de aumento da taxa de juros/enxugamento monetário nos Estados Unidos;
- Os efeitos climáticos da Argentina, que, após sofrer com seca e queda na safra, contribuiu para aumento dos preços da soja, privilegiando o Brasil como fornecedor alternativo.
Ameaças
- China – Para os empreendedores do agronegócio, a questão do Capitalismo de Estado da China merece atenção. Originados de uma nação praticamente agrícola, hoje já é o país mais industrializado do mundo e cresce continuamente. Tenciona também tornar-se o maior expert em inteligência artificial e tem como prioridade a política climática. Inclusive, em defesa da qualidade do ambiente local, adere à prática de importar quando a produção gera risco de poluição. Nesse contexto, os chineses têm demonstrado grande interesse pelo agronegócio brasileiro, com investimentos em logística e empresas, além do desejo de comprar terras no Brasil para produzir e exportar para si próprios;
- Rússia – Tradicional compradora de carne suína brasileira, no entanto, vem há tempo sinalizando a intenção de se tornar autossuficiente na produção da iguaria e caminha com sucesso para o objetivo. Prova disso é que as exportações brasileiras para o país em questão já encolheram cerca de 26%;
- Europa – O protecionismo europeu criou um critério de oneração sobre a soja que é exportada, o famigerado LUC (fator de alteração do uso da terra). Em resposta, o Sindirações se uniu em discussões com europeus e norte-americanos através do GFLI (Global Feed Life Cycle Assessment Institute). O esforço é evitar que as exportações agropecuárias brasileiras sofram taxação por externalidades;
- Compliance – Recentemente ao visitar o Brasil, as autoridades chinesas descartaram a necessidade de inspecionar a qualidade dos produtos, pois estavam mesmo interessadas em averiguar o compromisso ético, ou a conduta do produtor. A missão incluía a checagem de boas práticas de governança, conjunto de infrações e punições ao setor privado. “Além disso, a percepção externa é de um Brasil ainda com insegurança sanitária. E lamentavelmente, os últimos episódios constituem motivos para isso”, comenta Zani.
- Exportação de frango – O Brasil segue como líder mundial na exportação de frango, no entanto, a taxa de crescimento nesse quesito tem encolhido, ano a ano, ficando em torno de 6%. Enquanto isso, a Tailândia avança 17% ao ano e, em termos de crescimento proporcional, já lidera o ranking dos exportadores. Os motivos da queda brasileira estão relacionados à insegurança jurídica/compliance, à burocracia regulatória, e ao crescente custo de produção e de mão de obra.
Pontos Fortes
- Soja e milho – O Brasil continua sendo um grande produtor de soja, com safras recordes e generosas. Nesse ano, particularmente, a produção avançou quase 3%. O País deve encerrar o ano como o maior produtor da oleaginosa no mundo, ultrapassando pela primeira vez os Estados Unidos. Com relação ao milho, apesar do retrocesso da ordem de 9% na produção, ainda possui rentabilidade muito alta, o que devolve capitalização ao produtor;
- Disponibilidade de pastagens degradadas passíveis de recuperação – Diante da demanda mundial por mais alimentos para suprir a necessidade das atuais e próximas gerações, o Brasil se mostra como um produtor em potencial, graças à extensa área de pastagens degradadas que através da correção do solo, têm capacidade de produzir adicional quantidade de milho e soja. Alie isso ao fato de o Brasil ser o país com a maior preservação ambiental, superando 66% do território nacional, contra 25% da União Europeia e apenas 14% dos Estados Unidos, conforme dados do Banco Mundial.
Pontos fracos
- Estrutura arcaica do Ministério – Um ponto indispensável para benefício da agropecuária brasileira depende da modificação na estrutura funcional do Ministério da Agricultura, responsável pela regulação do setor. De acordo com Zani, o órgão é extemporâneo porque não acompanhou as evoluções do mundo, do setor privado, da globalização, das redes sociais e da tecnologia em geral. “No modelo existente, observam-se práticas antiquadas de inspeção e fiscalização que abrem brechas para que oportunistas inescrupulosos manchem a imagem do País”, analisa;
- Insegurança jurídica – Outra consideração feita pelo vice-presidente executivo do Sindirações está relacionada à insegurança jurídica consequente ao mutante arcabouço legal brasileiro, e a imprevisibilidade regulatória que confunde o cumprimento das regras.
Fatores de Risco
- Eleições e câmbio – Ariovaldo ressalta que um grande fator de risco para o agronegócio está relacionado à proximidade das eleições, à incerteza dada pela polarização da extrema Direita e extrema Esquerda, e a fragilidade da candidatura de Centro que sequer apresentou proposta de Governo. Há que se considerar também a crescente valorização do dólar que invariavelmente vai estimular a inflação, seja pela insegurança política interna, pela catastrófica situação fiscal, pela guerra comercial entre americanos e chineses, pelas ameaças militares entre EUA, Irã e Coréia do Norte, pelo preço do barril do petróleo, e até pela expansão de produção de etanol de milho na China.
- Logística – Outro ponto de atenção relaciona-se à logística de escoamento de grãos no Brasil. Assim como outras interfaces da agropecuária, o Sindirações sempre pleiteou junto ao Governo Federal uma alternativa de escoamento pelo Arco Norte. “O pedido foi atendido e, de fato, muito tem contribuído na saída da safra de milho e de soja. Essa facilidade, porém, diminui a oferta interna e faz com que o preço suba. Em resumo, a facilidade é muito boa para quem produz o milho e exporta, mas para a pecuária deve ser encarada como um risco a ser observado atentamente”, avalia Zani.
Proposta do Agronegócio aos presidenciáveis
O Sindirações integra o grupo de trabalho apartidário que elaborou e encaminhou aos presidenciáveis uma proposta em prol dos interesses do agronegócio. Trata-se de um documento baseado no princípio de “apresentar soluções, ao invés de problemas”. A proposta contempla sugestões de como implementar um Ministério da Agricultura “versão 4.0”, de viés estratégico, que valorizaria as tecnologias disruptivas, de banco de dados e da inteligência artificial em que a máquina faz o trabalho “braçal” e libera o auditor fiscal para ações mais estratégicas; a análise do risco alinhada às condições sócio/geográficas; a avaliação econômica do impacto regulatório e modulação dos prós e contras na aprovação de novas leis e regulamentos; a harmonização dos sistemas públicos para que todos os auditores tenham capacidade de realizar a mesma interpretação dos fatos; e a autorregularão privada, de maneira que cada produtor tenha liberdade para determinar sua forma de produzir, porém ciente de que o produto final será auditado pela necessária arbitragem oficial e exigida pelos clientes internacionais.
Reflexões
- “Gangorra agropecuária” – Como ponto de reflexão, Ariovaldo Zani pediu atenção do setor ao movimento que ele chama da “gangorra agropecuária”. Via de regra, quando a agricultura vai muito bem e com preços em alta, o produtor agrícola está capitalizado, no entanto, o pecuarista sofre por causa desses custos, e vice-versa. Trata-se de uma discussão de décadas e para a qual os envolvidos não encontram uma solução comum;
- Carcaças de animais mortos – “Se ainda persiste dúvida quanto à sanidade no Brasil, qual seria nossa imagem diante dos clientes internacionais se oficialmente for permitida a produção de farinhas/gorduras para alimentação animal das carcaças de animais que morreram sem inspeção ou por causa indeterminada? Há que se refletir bastante antes da tomada das decisões”, salienta Zani.
O que esperar do futuro – Quando o assunto é perspectiva, Zani aposta que ainda no curto prazo as discussões envolverão iniciativas que priorizem os elementos biológicos em substituição aos químicos; a edição gênica; a potencial terceira safra; a tomada de decisão com base na inteligência artificial; uso contínuo da internet das coisas na agropecuária; conectividade crescente; biocombustíveis renováveis; privatização do crédito rural; e logística com concorrência.
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